Mudança em sistema do Ministério da Saúde gera variações acentuadas no número de casos de Covid

Uma mudança no registro de dados enviados ao Ministério da Saúde tem provocado variações acentuadas no número de casos da Covid, e isso dificulta previsões sobre os rumos da pandemia no Brasil.

Era com uma mistura de esperança e alívio que os brasileiros vinham acompanhando a queda no número de casos de Covid no Brasil. Mas, a partir de setembro, mudanças abruptas nos dados oficiais, e que se refletiram na média móvel apurada pelo consórcio de imprensa, começaram a gerar preocupação.

Os dados sobre confirmação de casos de Covid passaram a ser afetados a partir do dia 8 de setembro. Foi quando o Ministério da Saúde mudou o sistema de notificação, passou a exigir mais informações, que alteraram a maneira de preencher os dados, e nem todos os estados e municípios conseguiram se adaptar rapidamente à mudança.

Orientações foram repassadas aos gestores dos bancos de dados como na explicação organizada pelo Conselho Nacional de Secretárias Municipais de Saúde: “Foram inseridos o campo ‘data de notificação’ e os campos referentes aos resultados do teste da fase aguda. Além dos campos ‘evolução do caso’ e ‘classificação final'”, diz o vídeo.

Mas, segundo o médico sanitarista e ex-diretor do DataSUS Giliate Coelho pode ter faltado tempo e treinamento para o uso da nova versão da plataforma de notificações.

“O ministério passou a exigir, por exemplo, o lote, o número de lote de alguns tipos de exame que são realizados. Então, antigamente, ele só pedia o dado se o exame foi realizado ou não e a data da realização. Exige um tempo de os profissionais se capacitarem, de os hospitais treinarem as equipes e também de modificação dos sistemas que são utilizados nos estados, nos municípios e nos hospitais. Quando a gente está no meio de uma pandemia, realmente é complicado você realizar qualquer mudança um pouco mais abrupta porque você corre o risco de o dado mínimo não ser enviado, que é o dado de notificação de Covid”, afirma Giliate Coelho.

Em São Paulo, Olívia Ferreira de Paula, assessora do Centro de Vigilância Epidemiológica, disse que a mudança exigiu uma revisão geral dos dados desde o início da pandemia. Só em São Paulo, são mais de 20 milhões de casos que precisam ser novamente analisados por técnicos da Secretaria Estadual da Saúde. Algumas informações não estão entrando ou não estão sendo lidas pelo novo sistema. Essa situação vem causando represamento desses dados revisados e, quando as informações são atualizadas, acabam liberando os números de uma vez, provocando as alterações abruptas que temos visto. Os técnicos de São Paulo já notificaram o ministério.

“Essa alteração não aconteceu de forma integral e completa no banco, porque isso leva tempo. Assim como o estado de São Paulo leva um tempo para processar os mais de 20 milhões de notificações de casos de Covid no estado, entre casos confirmados, suspeitos e descartados – é essa volumetria, é esse banco de dados que a gente tem que reprocessar todas as vezes. Então, o ministério mudou a chave e ficou pendente essa questão de alterar os resultados. Só que ele não havia notificado ninguém sobre esse período de reprocessamento e a necessidade de se reprocessar as bases de dados para ter o resultado correto”, afirma Olívia Ferreira de Paula.

Nesta quinta-feira (30), a Fiocruz divulgou que o Brasil registra o menor patamar de casos com síndrome respiratória aguda grave desde o início da pandemia. Um número que pode refletir um quadro diferente do apresentado pelos números das secretarias estaduais.

A professora Márcia Castro, da escola de saúde pública da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, diz que é grave ficar sem dados seguros, que atualizações no banco de dados são necessárias, mas não deveriam atrapalhar o acompanhamento da evolução da pandemia.

“Sem dados, você não tem como agir. Quer dizer, o poder da informação é exatamente você conseguir mensurar o problema e, portanto, achar respostas para o problema. A gente tem que se lembrar que o Brasil é muito grande. São 5.570 municípios e a capacidade de alguns municípios em se adaptar a essa mudança, que muda toda a rotina da coleta da entrada de dados, vai criar esse gargalo. Então, talvez a pergunta mais importante é por que houve essa mudança, como que essa mudança vai levar a uma melhor resposta por parte do governo e se, portanto, isso justifica o custo que a gente está vendo agora”, questiona Márcia Castro.

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